A maioria das pessoas abordadas pela Operação Segurança Presente, no Rio de Janeiro, são homens negros, ou seja, pretos ou pardos. A constatação é de um trabalho feito pelo major da Polícia Militar (PM) fluminense Leonardo Hirakawa, para a conclusão de mestrado na Universidade Federal Fluminense (UFF), com base em 1.217 abordagens realizadas pelos agentes de segurança, no bairro do Recreio dos Bandeirantes, na zona oeste da cidade do Rio.
O Segurança Presente é um programa de policiamento de proximidade, mantido pelo governo fluminense, que usa policiais militares em patrulhamento de rua em vários bairros do Rio, para suplementar o trabalho dos batalhões locais.
De acordo com o estudo Desvendando a Cor Padrão: O Viés Racial na Seleção do Suspeito na Operação Segurança Presente, 45% dos abordados pelos policiais eram pretos; 37,6%, pardos e apenas 16,3%, brancos. O resultado não soma 100% porque 1,1% não teve sua cor identificada na pesquisa.
Entre os pretos e pardos abordados, 68% estavam a pé, enquanto 24% estavam em motocicletas. Já entre os brancos, 40% estavam a pé e 50% em motos.
Segundo a pesquisa, isso mostra que, os brancos são mais abordados por estarem sobre motos do que por sua aparência, uma vez que a polícia identifica esse meio de transporte como o favorito a ser usado pelos assaltantes em seus atos criminosos.
“O indivíduo preto ou pardo que está a pé é abordado pela cor da pele. E o branco, que costuma ser mais abordado quando está andando de moto, é abordado por estar de moto e não pela cor de sua pele. É mais um dado que corrobora o viés racial”, afirma a orientadora da pesquisa, Verônica Toste.
O título do estudo refere-se à “cor padrão” uma terminologia informal que já foi usada, e hoje está banida, na comunicação entre os policiais para se referir à cor da pele do suspeito quando ele é negro.
Em sua pesquisa, o major Hirakawa percebeu que as atitudes racistas adotadas pelos policiais do Segurança Presente não são apenas fruto de uma cultura interna da polícia, mas são também demandadas pelos próprios moradores e comerciantes da região atendida pelo programa.
Segundo ele, a presença de pessoas pobres, de periferia e negras causa incômodo a muitos moradores de áreas como o Recreio, área majoritariamente povoada por pessoas de classe média e classe média alta.
“Nessas áreas, você não vê um carro de luxo sendo parado, não é o comerciante que vai sofrer a revista policial. São sempre essas pessoas [consideradas pelos moradores e comerciantes] como indesejáveis. E o indesejável quem determina não é a polícia. Quem determina é o morador. O próprio policial, às vezes, é conterrâneo do indesejável. O que difere ali é que ele está representando o Estado, fardado”, destaca Hirakawa.
Em seu estudo, o major cita o exemplo de um grupo de jovens de periferia que se reuniu na praia do Recreio para soltar pipa e, por pressão dos moradores do bairro, a situação acabou se tornando um caso de polícia.
“Isso virou um grande incômodo. Não demorou muito e eles já estavam aliando o pessoal que estava no festival de pipa a pessoas que roubam e a furtos em casas. E não tinha ligação lógica nenhuma. O policial acabou sendo forçado a atuar contra esses eventos”, disse.
Por meio de sua assessoria de imprensa, a Polícia Militar do Rio de Janeiro informou que, em todos seus cursos de formação e aperfeiçoamento de praças e oficiais, há disciplinas como direitos humanos, ética, direito constitucional e leis especiais.
“A questão racial perpassa, de forma muito incisiva, por todas essas doutrinas na formação dos quadros da corporação. Internamente, a Polícia Militar do Rio de Janeiro tem feito a sua parte para enfrentar o desafio do racismo estrutural ao longo de mais de dois séculos. Foi o primeiro órgão público a oferecer a pretos uma carreira de Estado e hoje mais de 40% do seu efetivo é composto por afrodescendentes.”
A PM destacou inclusive ter tido comandantes negros nos últimos 40 anos.
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