A presidência temporária do G20 — grupo formado pelas 19 maiores economias do mundo com a União Africana e a União Europeia — é uma grande oportunidade para que o país possa exercer seu protagonismo global e dá visibilidade para suas demandas, pautando as agendas social e ambiental no debate internacional. Assim avaliaram participantes de uma sessão temática do Senado, nesta quinta-feira (6). Para eles, o Brasil sai na frente em vantagens comparativas com as demais nações por ter experiências internas bem avaliadas, como a política de incentivo ao biocombustível e ao uso de energias renováveis, além de concentrar a maior biodiversidade do planeta.
O Brasil preside o G20 desde 1º de dezembro de 2023 até 30 de novembro de 2024. Com isso, o país vai sediar mais de 100 reuniões oficiais do grupo e a reunião da cúpula, nos dias 18 e 19 de novembro, no Rio de Janeiro.
A ministra de Meio Ambiente e Mudança do Clima, Marina Silva, disse que o Brasil precisa reverter essa posição estratégica em liderança e benefício à população brasileira, mas sobretudo, deve buscar alavancar alguns temas prioritários na agenda das 20 maiores economias do mundo, como o combate à desigualdade social e a promoção de um novo ciclo de prosperidade, com um modelo sustentável de desenvolvimento. Para ela, o país assume vantagem nesse debate por concentrar as maiores florestas do mundo e pela potencialidade ambiental.
— Nós temos uma grande oportunidade, porque isso é uma vantagem para o Brasil em termos da sua imagem, é uma vantagem para o Brasil em termos das suas possibilidades, porque, se é um país que pode associar seus produtos à biodiversidade, se pode associar seus produtos à preservação da natureza, ele tem uma vantagem comparativa nesse mundo em que cada vez mais a gente vai precisar mais do que produtos com valor nutricional, mais do que produtos com apresentação estética, vamos precisar de produtos que tenham valor ético, social, cultural e ambiental — disse ao lembrar que atualmente o mercado de crédito de carbono movimenta algo em torno de R$500 bilhões.
Oficialmente, o Brasil definiu três eixos de atuação durante o período de mandato na presidência do G20: combate à fome, à pobreza e a desigualdade; as três dimensões do desenvolvimento sustentável (econômica, social e ambiental) e a reforma da governança global.
A presidente da Comissão de Meio Ambiente (CMA), senadora Leila Barros (PDT-DF), destacou que reformar a governança global é um imperativo na busca de um mundo mais equilibrado, que reflita a conjuntura geopolítica atual e não mais aquela após a Segunda Guerra Mundial. Ela celebrou os temas escolhidos pelo governo federal como prioritários nesse processo de se pensar o futuro da humanidade, principalmente colocando o país como possível provedor de serviços ecossistêmicos e propulsor de ações efetivas para buscar a transição energética.
Leila ainda informou que a expectativa é que o projeto (PL) 412/2022 que cria o Sistema Brasileiro do Comércio de Emissões de Carbono seja aprovado definitivamente pelo Congresso Nacional ainda este mês. A senadora foi relatora da matéria quando aprovada no Senado. O texto aguarda a deliberação dos deputados.
— Nós estamos trabalhando para que ainda nesse mês de junho, que é o mês em que se comemora o meio ambiente, não é só uma resposta para os brasileiros, aqueles que estão sofrendo muito com as mudanças climáticas, todos nós, mas também para o mundo. Acho que o Brasil já vai entrar no G20 com uma proposta, de fato, importante na redução das emissões do gás do efeito estufa.
O secretário-executivo adjunto do Ministério da Fazenda, Rafael Dubeux, alertou para a urgência em se colocar em prática a agenda de transformação ecológica, diante da crise climática enfrentada pelo mundo. É o momento, segundo ele, de o Brasil substituir o histórico de desenvolvimento econômico baseado na destruição da Mata Atlântica, da Amazônia e do Cerrado em um modelo que consiga crescer a partir de uma relação integrada e respeitosa com a natureza.
Ele citou como grande potencial do país as fontes renováveis de energia, alternativa eficiente para descarbonizar parte do setor produtivo. E destacou as políticas de parcerias e financiamentos.
— Nos últimos cinco anos, o volume de recursos desembolsado pelo Fundo Clima ficou em torno de R$ 0,2 bilhão por ano. A gente vai passar de R$ 0,2 bilhão para algo em torno de R$ 10 bilhões por ano (…). Muda a ordem de grandeza do papel do Fundo Clima na economia brasileira. Outra medida importante é a criação do programa que a gente tem chamado de Eco Invest Brasil, um programa dehedgecambial para proteger justamente esses investimentos de longo prazo que podem fazer uso da matriz renovável do Brasil para atrair novos investimentos e ampliar a produção de baixo carbono no Brasil, superando um dos obstáculos para investimentos, que é justamente o risco de volatilidade cambial nos países em desenvolvimento.
O secretário-executivo do Ministério do Meio Ambiente e Mudança do Clima, João Paulo Capobianco, registrou que este é um momento “extremamente rico” para que o Brasil coloque de forma muito proativa suas prioridades, recuperando a sua credibilidade. Ele citou o reconhecimento dos serviços ecossistêmicos naturais brasileiros com o aproveitamento do biocombustível na transição energética.
— Nós temos a oportunidade no G20 de mostrar que o nosso biocombustível não é um biocombustível que degrada a Amazônia. Ao contrário, a nossa produção recupera áreas, nós temos a oportunidade de mostrar que o nosso biocombustível é uma solução para a produção de combustíveis com baixa emissão, uma alternativa internacional, ou seja, nós colocamos o Brasil na linha de frente e conseguimos com isso, inclusive nesse debate tão importante e tão qualificado, quebrar mitos, quebrar tentativas de imporem à nossa produção de biocombustíveis fatos que não são reais, como, por exemplo, que ela degrada, que utiliza terras agrícolas, que não produz alimentos, e nós podemos mostrar que isso não é a realidade.
Na avaliação do secretário de Assuntos Econômicos e Financeiros do Ministério das Relações Exteriores, Mauricio Carvalho Lyrio, os desafios globais se tornaram ainda mais agudos, como fome, pobreza, desigualdade, conflitos armados com consequências humanitárias catastróficas, inflação alta nos países ricos e dívida pública elevada nos países pobres.
Ele informou que, diante da realidade de mais de 150 milhões de crianças com até cinco anos passando fome no mundo, o Brasil criou uma força tarefa no G20 para lançar a Aliança Global Contra à Fome e à Pobreza. A mobilização será aberta a todos os países e tomará medidas concretas para integrar um conjunto de instrumentos de política pública que foram bem sucedidos em países em desenvolvimento.
— A aliança será aberta a todos os países e tomará medidas concretas para integrar um conjunto de instrumentos de política pública que provaram ser bem-sucedidos em países em desenvolvimento, incluindo transferências de renda direcionadas, programas de alimentação escolar, apoio à agricultura familiar, sistemas de cadastro único para pessoas e famílias de baixa renda e mecanismos de segurança social. Pela primeira vez, temos a oportunidade de universalizar programas sociais que permitiram a países do sul global, como o Brasil, ampliar de maneira significativa o número de pessoas com acesso regular a alimentos e aos meios básicos de sobrevivência.
Segundo dados da ONU, atualmente, cerca de 735 milhões de pessoas atualmente enfrentam a fome, e 2,4 bilhões, a insegurança alimentar moderada ou severa.
No centro da governança global, conforme Lyrio, a Organização das Nações Unidas (ONU) precisa ser reformulada. No entendimento do governo, a ONU foi criada para evitar as guerras e manter a paz, o que não tem ocorrido.
Segundo o Instituto Internacional de Estudos Estratégicos, de Londres, o mundo teve no ano passado um número recorde de conflitos: foram 183 guerras entre e dentro dos Estados. Essa é a maior marca em três décadas, o que retorna aos padrões de conflitos do período da Guerra Fria.
— Na reunião de ministros das Relações Exteriores do G20 — realizada em fevereiro, no Rio de Janeiro —, o G20 endossou a proposta brasileira de convocar uma reunião de chanceleres do G20, em Nova York, e, pela primeira vez na sua história, o G20 se reunirá na sede, com todos os membros das Nações Unidas. Será oportunidade para o grupo se unir a outros membros da ONU em defesa de um chamado à ação pela reforma das instituições de governança global, com as Nações Unidas no seu centro.
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