Ao som do canto dos pássaros, ao entardecer, no coração do Cerrado, a loba-guará Pequi, como é carinhosamente chamada, finalmente conheceu a sensação de estar livre em seu habitat natural. Foram dois anos vivendo em cativeiro para que tudo desse certo durante o seu retorno à natureza. O projeto de soltura do animal faz parte do Plano de Ação Nacional para a Conservação da espécie, coordenado pelo Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio).
O desfecho dessa história era aguardado desde junho de 2020, quando cinco filhotes de lobo-guará foram resgatados na Bahia depois de a mãe, Caliandra, ter sido encontrada morta. Graças ao acolhimento inicial no Zoológico de Brasília, os filhotes cresceram e se desenvolveram bem.
Desde o início, os cuidados eram voltados para que os animais pudessem retornar à natureza. “O Zoológico de Brasília é um centro especializado e nós recebemos esses filhotes com toda a expertise da nossa equipe para que eles se desenvolvessem bem. A criação foi diferente para a soltura dar certo, para que eles vivessem na natureza longe do homem”, explicou o diretor de mamíferos do Zoo, Filipe Reis.
Alimentação com frutos do Cerrado, pouco contato com humanos e um período longo de adaptação foram cruciais para que os animais estivessem preparados para a soltura. A Pequi foi solta na tarde desta segunda-feira (17) e seus irmãos seguem colaborando com outros projetos de conservação da espécie no estado da Bahia.
“Aqui onde a Pequi foi solta é um espaço enorme, com 800 hectares, e segura bem a pressão urbana, que só cresce”, disse o gerente geral do Instituto Paraíso na Terra, Rogério Peleski. Na nova casa, Pequi pode explorar todos os seus instintos naturais de animal silvestre, como caçar, reproduzir e forragear.
Para que todo o projeto de soltura da loba pudesse acontecer, uma equipe de mais de 30 técnicos da ONG Jaguaracambé se dedicou por mais de 24 meses para que o contato livre da loba com meio externo fosse o mais natural e seguro possível. Os especialistas também contaram com o apoio do Instituto Brasília Ambiental, do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) e do ICMBio.
“Nós, do Ibama, fomos os responsáveis por trazê-la até Brasília. A gente apoia toda essa campanha para soltura de animais porque é fundamental para a conservação e faz parte do nosso trabalho”, defendeu a coordenadora de Gestão e Monitoramento da Biodiversidade do Ibama, Juliana Junqueira.
A partir de agora, Pequi será monitorada por meio de um rádio-colar, instalado em seu pescoço, que enviará aos especialistas, a cada hora do dia, a localização em satélite por onde a loba passou. Além disso, o equipamento permite que a equipe receba um mapeamento com esses dados quatro vezes por dia.
“Eu estou emocionadíssima. Hoje nós finalmente soltamos a Pequi depois de meses trabalhando em várias linhas de pesquisa para que ela estivesse apta para sobrevivência no Cerrado”, disse, emocionada, a médica veterinária e presidente da ONG Jaguaracambé, Ana Paula Quadros. Ela também pede apoio para que o projeto de monitoramento continue. “A gente precisa garantir o segundo rádio-colar da Pequi, porque esse primeiro foi doado pela Smithsonian Institution e precisa ser trocado daqui oito meses. Qualquer ajuda é bem-vinda”, concluiu.
Relembre a trajetória dos filhotes de lobo-guará resgatados órfãos.